sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Capitulo 3 (O Caminhante)



John ainda se lembra do que escreveu numa folha velha, palavras que lhe ecoaram durante muito tempo: «do not be content with second best but only with the best». The best! Agora neste momento pensa, “mas porque temos que ser ambiciosos se nesse momento o que nos parece ser melhor não o é na realidade”.O momento fugaz e fortuito de pensarmos que isso ou aquilo ou aquele outro que não está á nossa frente é o melhor. Aquilo que temos é sempre melhor do que aquilo que não temos! Seremos felizes? Apenas e só, quando tristes não conseguimos ter aquilo que queremos? Love what you have and not what you need! Claro que sim”, pensa John enquanto caminha.
 Lisa e Mary eram mulheres de diferentes idades e de diferentes temperamentos. Mulheres que amaram John. Mulheres que sem pejo nenhum se entregaram de corpo e alma. Mulheres que pelo seu valor ficaram enraizados no corpo e na alma de John. Lembra-as agora com saudade e magoa. Deixou-as, largou-as, desprezou-as sem dar satisfação nenhuma. Não consegue pensar numa sem ter a memória da outra colada. Sem querer sentiu-se atraído por Lisa logo no primeiro contacto. Mulher de trato fácil e pronta a agradar. Mais nova, dois anos que ele. Convite para jantar em casa dela passou a ser habitual. Pantufas no fim. Pantufas compradas em conjunto com a escova de dentes após a primeira estadia em casa dela. Sentia-se como se fosse um sultão das arabias. Lisa sua concubina. Mas para ele era muito fácil. Fácil de mais. Demasiado fácil. Não estava habituado a essas mordomias. E muito menos a mordomias feitas por uma mulher. Assim John pensou que, exageradamente, poderia fazer com ela o que quiseste. Assim o idealizou e assim o implementou. Aprendeu as suas custas e deu por si a dizer certo dia, alguns anos passados, para um amigo que a «experiência é um pente que aparece quando ficas calvo». Começou por omitir e passou a mentir descaradamente. Mary apareceu por essa altura. Encontrou-a perdida num bar. Tinha-se divorciado á menos de uma semana de uma relação de oito anos. Divorciado é uma maneira de dizer. Na realidade não tinha casado. Apenas o casamento que se deveria ter realizado se esfumou como o fumo do cigarro que tinha entre os dedos. Finos, tal como toda a sua figura. Elegância em pessoa. John pensa agora que tinha ido a esse bar porque estava farto das perguntas de Lisa. Diria mais tarde que «Os homens mentiriam muito menos se as mulheres não perguntassem tanto». Lembra-se da história que Mary lhe contou quando no dia do “divórcio” chegou a casa. «Estava sentada no velho sofá a remoer a vida quando, um velho cão e com olhar cansado, decidiu entrar no meu jardim e assomou á porta de vidro da sala. Vi pela coleira e pelo brilhante que era bem alimentado e tratado. Veio calmamente até mim. Fiz-lhe uma festa. Depois segui-me e entrou em casa. Passou pela sala e foi-se deitar no sofá e adormeceu. Uma hora depois acordou e dirigiu-se para a porta. Pensei que deveria querer ir-se embora. E assim fez sem olhar para trás. No dia seguinte voltou e repetiu os mesmos gestos. Fiquei curiosa pois fazia isto todos os dias. Coloquei assim um bilhete na coleira, que dizia, «Gostaria de saber quem é o dono deste lindo animal e perguntar se sabe que ele vem todas as tardes dormir no meu sofá». No dia seguinte ele chegou com um bilhete na coleira que dizia, «Ele mora numa casa com seis crianças, duas das quais com menos de três anos, provavelmente ele está tentando descansar um pouco. Posso ir com ele amanha?» ”. Mary, com olhar cândido conta a historia e John com o semblante enternecido apaixonava-se pela história. Mas tarde lembrou-se que não era a história que o fizera ficar em estado de paixão, mas sim a maneira como era contada, com entusiasmo com aquele brilho nos olhos de quem se sente feliz com os acasos da vida, com as ironias do destino. Mas sem interromper continuou extasiado a ouvir. «Respondi claro que poderia vir e no dia seguinte por volta das seis da tarde, novamente, a cheirar o vidro da porta da sala lá estava ele. Vinha acompanhado por uma criança. Deveria ser essa criança que responderá ao meu recado. Entraram e conversamos algum tempo. O cão apenas se tinha voltado a enroscar no sofá e atento a nossa conversar adormecia por momentos. Mas os seus olhos abriam de vez em quando para verificar os nossos olhos de conversa. Foi um dos fins de tarde mais esclarecedores da minha vida. Aquela criança, a sua voz, o seu corpo singelo, a sua companhia trouxeram-me a paz que há muito ansiava. Depois daquele dia nunca mais os voltei a ver. Por mais que os procurasse nada soube mais deles. Amei incondicionalmente aquele momento. Tornei-me novamente amante de mi mesmo. Senti que amar é mais difícil quando o objeto do nosso amor nos aborrece constantemente” John persentiu nestas palavras a mágoa profunda que Mary trazia dentro de si. E acrescentou que “é mais difícil aborrecer quem nos ama que amar quem nos aborrece”. Esse pensamento ficou suspenso e associado á lembrança fugaz de Lisa. Aborrecer a quem nos ama é crueldade. E isso é o que tinha feito a Lisa desde que a conhecerá. Mas a torrente de palavras de Mary não o deixava seguir esse pensamento. Não o deixava ficar calado nos seus próprios pensares. Escutava Mary com afinco. A história que lhe contava fazia-o tremer de comoção pelo ser belo que se encontrava a sua frente. Amava já Mary sem o saber. A inquietação no seu ser era perversa. Trocar Lisa por Mary era a verdade nesse momento. Trocar na verdade não. Tornar-se vivo amando o momento, isso sim. E Lisa? Nela nada de mais se passava dentro dele. Apenas existia penar em relação a ele e a ela. Um salto vertiginoso da sua alma o impulsionava para a frente. Olhando para trás nada via.   




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